Casualmente, ele deixou o garfo pousar no prato. Casualmente fez-se aquele som tão familiar, que no ambiente corta o silêncio sem interrompê-lo. Levou o guardanapo aos lábios, não que estivessem sujos. Fitou brevemente a janela, a linha de seu olhar acima dos olhos dela.
Ela, ao enganar-se, quis sorrir. Fitou as mãos dele, sua camisa, as flores do papel de parede já desbotado, bebeu do suco, levou uma garfada à boca e por sua vez, pousou delicadamente os talheres no prato.
Ela baixou os olhos, como que pensativa ou alheia. Ele tornou a olhar na direção da janela, que estava aberta. Quis dizer que seus cabelos tinham um tom de mel quando contra a fraca luz do sol que vinha de fora - uma cor fugaz da luz do meio-dia de outono que o fazia lembrar um livro que lera, ou um filme que assistira já há muito tempo. Ou talvez de nada disso. Quis dizer que gostaria de fotografá-la, se soubesse como fazê-lo. Quis dizer que através daquela janela aberta, da luz que chegava em seus olhos filtrada por seus fios castanhos - através daquela luz, quis dizer que ouvia música. Quis dizer que ouvia um som distante de um disco de vinil, conservado por saudosistas românticos e apagados como ele. Quis dizer que estava linda. Quis levantar da mesa, quis ir lá fora, quis que no assoalho houvesse um tapete, quis que junto à parede houvesse um vinil que, como ele, permanecesse girando sob uma agulha fina e gentil. Quis vê-la nua como na primeira vez - e ela certamente iria sorrir, ela certamente baixaria o rosto e sorriria por baixo de seus cachos castanhos em desalinho. Quis dizer que gostava de qualquer paisagem no outono. Quis enterrar seus dedos nos seus cabelos penteados.
Após examinar longamente o padrão de sua sua camisa, ela subiu olhar aos olhos negros que agora lhe fitavam. Ele sorriu, e em seu sorriso havia uma amargura que ela desejou não reconhecer.